Poderia ser um sonho, parecia ser um sonho… Acordava toda vez no deck principal, flutuando à luz da gigante Sirius A que se aproximava. Como conseguira se desprender do casulo de hibernação, era um mistério. 

Sentia-se imersa num labirinto de dimensões e realidades distintas. Perdida como um átomo solitário entre moléculas distantes. Ou seria como um diminuto planeta entre sistemas solares longínquos? Precisava voltar, despertar o corpo, antes que causasse algum acidente potencialmente fatal.

Ouvia nitidamente os zumbidos, bipes e estalos monótonos saídos das entranhas da imensa concha metálica. Mas poderia jurar estar dormindo, parecia estar dormindo… Entretanto, silenciosamente, continuava a flutuar em direção à intensa luz vinda da escotilha principal. Como haveria dado o impulso inicial para isso e o por quê, era outro mistério.

As horas se contraíam para quem viajava próximo à velocidade da luz, assim como se diluíam para os que ficaram na base. Ou seria o contrário? Não fazia diferença alguma agora. Nunca mais se encontrariam.

Tempo, espaço, massa, movimento. Tinha tudo isso de sobra. Menos o peso, que não sentia desde que entraram em órbita. Era como se sentia: presa pela inércia, sob o domínio de um impulso invisível e irresistível. 

Sem mover as pálpebras, suas mãos tocaram levemente os controles biométricos da escotilha. Outro bipe irritante e a luz vermelha do led indicavam uma ação catastrófica em andamento. Pairava no ar saturado de ozônio, seus cabelos flutuando à sua volta num harmonioso desalinho aleatório. Os lábios entreabertos pronunciaram a frase código num murmúrio quase solene.

Em seguida, torceu uma alavanca embutida no console e a puxou para si, torcendo-a mais uma vez, agora na direção oposta. Escutou um clique e a pergunta interna: como estará a brisa nesta manhã?
.
.
.
Zartos©2024

You may also like

Back to Top